sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Será que programa de qualificação do governo Lula precisa ser varrido do mapa?

por Cláudio Magnavita*

O turismo oficial brasileiro vive a sua prova de fogo. Sairá desse processo de purificação mais fortalecido ou chamuscado. O rescaldo da Operação Voucher ainda está ocorrendo. A tentativa de virar a página emperra na corajosa atitude de separar o joio do trigo, principalmente na área da capacitação profissional.

Com a Copa 2014, coube ao Ministério do Turismo a missão de qualificar a mão-de-obra já empregada. Motivar quem já está na zona de conforto de um emprego fixo foi o grande desafio do governo Lula.

Para atender os desempregados e os que sonham conseguir um emprego através de um curso de qualificação já existem mecanismos públicos, inclusive programas do Ministério do Trabalho. A motivação vem com a promessa de emprego. Para qualificar os profissionais que estão atuando e que cumprem jornada de emprego o aspecto motivacional é mais complexo.

A fórmula da administração Lula foi buscar o apoio da iniciativa privada. Um pacto inusitado entre capital e trabalho. Coube aos empregadores a responsabilidade de mobilizar sua tropa e colocar seus funcionários na sala de aula.

As entidades que representam as diferentes categorias de profissionais do setor do turismo foram convocadas. A palavra é esta mesma: CONVOCAÇÃO, através do Governo Federal para desenvolver um programa de qualificação bem amplo. Para garantir o conteúdo e chancelar a execução dos programas, foi escolhida uma entidade acima de qualquersuspeita, a FGV (Fundação Getúlio Vargas). A FGV foi a fiadora dessa ação e desenvolveu um programa de acompanhamento on-line da sua execução.

As entidades escolhidas pelo governo representam legitimamente os seus segmentos no CNT (Conselho Nacional de Turismo). Essa triagem evita, neste caso, que programas sejam entregues a entidades fantasmas, como ocorreu no Amapá, através de emendas de uma deputada federal por aquele Estado.

Aliás, essa parte boa do programa de qualificação iniciou uma verdadeira revolução no turismo e na relação patrão/empregado. A esse segmento houve até a adesão da Contratuh (Confederação dos Trabalhadores do Turismo e Hospedagem), que também foi convocada para um programa de qualificação.

O joio deste processo são as entidades fantasmas que sugiram depois e até mesmo sem nenhuma legitimidade institucional ou representatividade. Ao invés de punir esses abusos cometidos por representações fantasmas, o que assistimos agora é uma inversão davelha máxima, onde todos são inocentes até que se prove o contrário.

As entidades sérias correm o risco de serem tragadas para o fosso da inadiplencia sem terem o seu direito de resposta devidamente analisado. Elas correm o risco de assistir a interrupção dos programas de qualificação que estão em curso, de serem declaradas inidôneas e proibidas de conveniar novamente com o Governo Federal e de até realizar a devolução de parte das verbas recebidas. Tudo isso pela incapacidade de ter no Ministério do Turismo uma equipe que analisasse tecnicamente as respostas das entidades aos questionamentos da CGU.

É como se, de uma hora para outra, tudo que foi realizado no governo Lula na área de qualificação para a Copa estivesse podre e realizado de maneira errada. Se a atitude fosse tomada por um governo de oposição seria compreensível. Faz parte do jogo político. Só que isso ocorre em um ministério do PMDB, partido que faz parte do governo e que tem a Vice-presidência da República.

A falta de tato na condução dessa execução em massa é inacreditável. As entidades do turismo estão sendo coagidas a reagir a ponto delas próprias exigirem a separação do joio do trigo. É como se a interrupção dos programas que estão em execução pela metade não gerasse prejuízo aos cofres públicos.

Transformar em bandidas entidades sérias, algumas com dezenas de anos de tradição, pode abalar os alicerces de um setor que se organizou e que cresceu com representatividade exatamente pelos programas do mesmo governo. Só que agora essa administração é crucificada pela incapacidade de tempo e, de certa forma, de coragem de uma equipe de servidores públicos escolhidos para serem os verdugos desse passado recente.

Quem errou deve ser exemplarmente punido. Cadeia para quem roubou o dinheiro do povo! Mas para que isso ocorra é necessário haver justiça. Inocentes não podem pagar no lugar dos bandidos. Se houvesse altivez e preocupação de agir com justiça, preservando aqueles que aceitaram a missão dada por um governo que elegeu o seu sucessor, a situação seria diferente. Não estaríamos na beira de um embate entre o setor privado e os atuais dirigentes do Ministério do Turismo. O diálogo não pode ser estabelecido apenas pela ameaça do uso do tacape.

O Ministério do Turismo precisa passar por um processo de serenidade.Deve-se estabelecer o respeito aos secretários nacionais, todos legitimamente nomeados. A secretaria executiva tem que participar e colaborar com cada passo e não descobrir o que ocorre na pasta através da leitura do “Diário Oficial”. As entidades que fazem parte do Conselho Nacional de Turismo devem se sentir respeitadas e devem perceber que o discurso do MTur está afinado com a sua prática. Os programas desenvolvidos pelos ministros anteriores devem ser respeitados.

Decisões intempestivas, como o fim abrupto da edição 2012 do Salão de Turismo, devem passar por uma ampla consulta. Perdemos a nossa vitrine quando mais precisávamos dela. Os secretários estaduais de Turismo precisavam ser consultados previamente antes do surpreendente anúncio no Fornatur.

O que precisamos é restabelecer a confiança, a serenidade e criar um clima de união. O MTur pode seguir o exemplo do que ocorreu com o Ministério do Esporte, no qual o ministro Aldo Rebelo colocou ordem e, corajosamente, separou o joio do trigo.

O senador José Sarney (PMDB-AP) demonstra com atitudes, conselhos e coragem que política não se faz apenas como uma boa conversa. É preciso ter muito mais do que uma boa lábia. No dia que Lula deixou o poder, o senador foi o único político que acompanhou o já ex-presidente da República até sua residência em São Bernardo (SP). Mostrou ao Brasil o seu respeito a um presidente que fez história e que promoveu no turismo uma verdadeira revolução. Criar o MTur foi uma decisão pessoal de Lula. Ele o criou e o preservou.

Hoje, o que assistimos é uma verdadeira desconstrução de tudo o que foi feito nos últimos oito anos. Será que os parceiros que aceitaram a convocação de preparar - no governo de um operário - os trabalhadores brasileiros para os megaeventos esportivos serão jogados aos leões sem que ninguém reclame?

Talvez, o grande erro tenha sido a tentativa de qualificar o trabalhador. Aquele que tem carteira assinada e que além de se submeter a uma jornada de trabalho tinha que sentar em uma sala de aula ou diante de uma tela de computador para tentar crescer na vida. Se fosse um programa para beneficiar empresários e trocar as geladeiras e televisões dos hotéis não faltaria quem aparecesse para defender e lutar por sua continuação.

O ministro Gastão Vieira pode se espelhar no exemplo do seu líder maior, José Sarney, e demonstrar o respeito pelo que foi feito no governo do presidente Lula na sua pasta. Ele tem a sorte de ter um secretário executivo como o Valdir Simão, que tem o aval do Planalto e da Casa Civil, além de ser um excelente gestor público. Ainda conta com dois secretários nacionais, Fábio Mota e Isabel Mesquita, respaldados por correntes fortes do PMDB, além da simpatia inicial do CNT (Conselho Nacional de Turismo), através do endosso dado pelo ex-ministro Walfrido dos Mares Guia. Na Embratur de Flávio Dino, um conterrâneo maranhense de quem é opositor regional, está sendo aplaudidíssimo pela sua atuação no executivo e tem sido ético de afastar as picuinhas da politica maranhense.

O ministro tem dado demonstração de humildade e de vontade de acertar. A partitura da banqueta do maestro parece se diferente daquela que foi distribuída para a orquestra. Para haver harmonia, todos precisam tocar a mesma música. Gastão está com a batuta na mão e para começar o seu concerto, sem trocadilhos da palavra, é preciso união, respeito e coerência.

*CLÁUDIO MAGNAVITA é presidente do Jornal de Turismo e membro do Conselho Nacional de Turismo do MTur

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