quinta-feira, 31 de maio de 2012

A DesMemória da Pedra

Pedra da Memória
Muitos monumentos de São Luís do Maranhão foram destruídos ou abandonados. Belos chafarizes, esculturas, placas de bronze, fontes, bustos esculpidos de grandes homens que fizeram a história da nossa cultura desapareceram do cenário urbano da capital maranhense, elevada, em 1997, à condição de patrimônio cultural da humanidade. No momento em que se aproxima a data comemorativa dos 400 anos da cidade, muitos monumentos que ainda resistem ao tempo se encontram abandonados, deteriorados ou descaracterizados.
 
Dentre tais exemplares, podemos citar a famosa Pedra da Memória, localizada atualmente na Avenida Beira-Mar, precisamente no baluarte de São Cosme, a primeira ‘meia-laranja’ que integra o conjunto arquitetônico do antigo forte de São Felipe, sobre o qual se encontra instalado o Palácio dos Leões, sede do governo do estado. O obelisco, construído em 1841, foi inicialmente instalado no velho Campo do Ourique (onde se localizava o antigo quartel de São Luís, atual praça Deodoro, na qual se encontra a Biblioteca Pública Benedito Leite), e foi erguido homenageando o então Imperador D.Pedro II, quando do advento de sua maioridade.
 
Com a demolição do quartel, o monumento quase se extraviou. Graças ao empenho do escritor maranhense Joaquim Luz, a Pedra da Memória foi transferida para a Avenida Beira-Mar. Ali, foi rodeada por dois velhos canhões, relíquias do período colonial, e que conferiam charme ao conjunto. Sua estrutura é feita a partir de pedra de cantaria.
 
A partir do Largo dos Remédios, passando pela praia Pequena, até o baluarte de São Cosme, havia outrora um grande lamaçal. No contexto da construção do cais, a intenção era evitar a destruição do baluarte pelo mar, além de facilitar a interligação entre a Praia Grande e a igreja dos Remédios, acabando-se assim com o lamaçal. A obra promoveu uma grande melhoria na urbanização da cidade. A construção da mesma esteve a cargo do capitão general D.Diogo de Sousa, Conde do Rio Pardo,  imortalizado num dos romances de Josué Montello, ‘Cais da Sagração’.
 
Foi assim que surgiu a Avenida Beira-Mar, também conhecida como Avenida Jaime Tavares, homenagem a esse ex-prefeito de São Luís que construiu essa avenida em sua administração. Há alguns anos, por determinação do IPHAN, os canhões que emolduravam a Pedra da Memória foram removidos para local ignorado. Recentemente, o monumento sofreu séria avaria após sofrer a colisão de um ônibus, sendo posteriormente recuperado.
 
Após perder o charme da guarnição dos dois belos canhões que a guarneciam, a pedra da Memória recebeu, recentemente, uma lutuosa pintura preta ao seu redor. Essa ação retrógrada em relação ao nosso patrimônio atesta não apenas o descaso da gestão pública, mas, também, uma ignorância bovina no que se refere ao aspecto estético e ao valor histórico que repousa sobre nossos monumentos públicos.
 
O célebre pintor, arquiteto, poeta e urbanista Araújo Porto Alegre, no início do século XIX, sabiamente escreveu que “cada pedra colocada pela mão do homem na construção de uma cidade é uma letra no alfabeto da civilização”. Em São Luís, os gestores públicos, ao não respeitarem o valor de tais pedras, também representadas por monumentos como o que ainda resiste ao tempo no baluarte de São Cosme, exercitam uma daninha lição de analfabetismo em relação à nossa memória histórica.

Um comentário:

  1. Não sei quem é o autor do excelente texto, mas se não se identificou é porque assim achou melhor. Eu não poderia deixar de me manifestar a respeito do assunto abordado que costuma ser ignorado pela maioria da população. Só com protestos veementes através dos meios de comunicação, manifestações públicas ou do tradicional método do "boca-a-boca" pode-se demonstrar indignação e tentar reverter o quadro. Não dá mais para ficarmos calados, aceitando todo tipo de desmandos e desrespeitos com nosso valioso patrimônio que, apesar de pertencer ao povo, é tratado como propriedade particular. Cometem absurdos, a bel-prazer, sem dar satisfações a ninguém. Como se fôssemos simples figurantes de uma ridícula peça de bufão. Às vezes, revendo antigas fotos de meus arquivos, descubro algumas preciosidades que há algum tempo orgulharam nossa cidade, ornamentando praças e avenidas, e que desapareceram sem deixar rastros. É o caso de um monumento que existiu na Av. Pedro II, em frente à prefeitura, homenageando os fundadores da cidade. Desapareceu misteriosamente. Poucos ainda se lembram dele. Outro caso de falta de sensibilidade: para marcar a ocasião em que o aviador Pinto Martins amerissou em águas da cidade, foi erigido um belo monumento encimado por uma águia de bronze. Furtado, não se sabe quando e nem por quem, teve a escultura da ave de rapina substituída por uma grotesca cabeça de marinheiro em concreto - que me perdoem se estou enganado quanto ao material empregado na "obra". Assim, não poderia deixar de me congratular com o autor dessa oportuna e justa manifestação de revolta. Que outros mais ajam de igual forma sempre que se sentirem usurpados de seus direitos de cidadãos. É o mínimo que podemos fazer pela preservação da história e cultura de nossa capital.

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