sexta-feira, 22 de junho de 2012

Mulher de fibra

De repente, a maioria das pessoas não sabe de onde, apareceu na vida da cidade aquela mulher que carregava consigo tanta simpatia e carisma.

Não era o que se pode chamar de uma mulher bonita, mas, também, não era feia. Aliás, sua presença fazia com que todos se esquecessem de classificá-la de acordo com os padrões de beleza estabelecidos.

Era negra e pobre, mas trabalhadora como poucas. Tinha de suar muito para criar e dar o sustento àquela grande prole que pariu. Foram ao todo vinte e três filhos, sem contar os que perdeu antes de nascerem.

Sei um pouco de sua vida. Não que tenha pesquisado, mas pelas próprias circunstâncias que me acompanharam ao longo de minha existência.

Quando tinha uns sete anos de idade e chegado do interior do estado, onde nasci, fui morar na Rua do Norte, onde meus pais possuíam uma casa. Ao lado, ou opegado, para ser mais fiel às nossas tradições maranhenses, morava Dona Naia, seu marido Stênio Carneiro e filhos. Daquela vizinhança nasceu uma amizade que persiste por tantos anos. Assim foi tomei conhecimento de que, em alguma época, haviam criado aquela jovem que viria a ser a mais conhecida e conceituada doceira popular que já surgiu em São Luís. 

Seu nome, como muitos dos que estão lendo esta crônica já antecipam, era Salomé. Não sei seu sobrenome, mas isso pouco ou nada pode acrescentar àquela criatura de coração de ouro e mãos de fada. 

Falei em doceira, mas, igualmente, cozinhava quitutes tão deslumbrantes que parecia ter frequentado os bancos de alguma escola de culinária. Tudo obra de um talento nato. Nunca, ou pouco, frequentou escolas. O dia a dia foi sua faculdade. 

Tão boa doceira e cozinheira que por muitas vezes foi requisitada por governadores para preparar banquetes de palácio. Autoridades com as quais manteve um relacionamento tal a ponto de lhe proporcionar algumas chances de representar o Maranhão em festividades além, no que se refere ao item gastronomia.

Ajudada espontaneamente ou por quantos procurasse, em dinheiro, açúcar ou frutas, fazia os doces mais maravilhosos que se possa imaginar. Quem a conheceu jamais esquecerá o sabor de seus doces de batata-doce, batata-roxa (lamentavelmente extinta), buriti, bacuri, cupu, jaca e tantos outros. Chegou a criar uma marca para seus produtos, que ainda hoje é explorada por alguns filhos em barracas armadas em arraiais de São João: “Salomé – Sempre Viva”.

Salomé nasceu na Maioba. Maioba do Vassoural, onde conheceu o caboclo Anastácio com quem passou a viver e que foi pai de seus muitos filhos.

Depois de incontáveis anos juntos, de tantas labutas, tantas alegrias e tristezas, a conselho de amigos, resolveram se casar. Casamento que não durou muito tempo. Devido a tramas do destino, que ninguém pode explicar, separaram-se. Dizem que já próximo de seu fim voltaram a dividir o mesmo teto.

Morreu ela vítima dos inevitáveis males provocados pelo diabetes. Desapareceu deste mundo, mas deixou como herança para seus filhos que ainda vivem, o exemplo dignificante de quem passou a vida trabalhando com honestidade e cercada de admiradores.

Salomé é daquelas pessoas que, sem favor algum,  merecem ser homenageadas de alguma forma pelo poder público. São tantos aqueles que recebem tal distinção apenas como reconhecimento por haver exercido algum cargo político, ou como simples prova de amizade, que não seria nenhum absurdo lhe prestassem essa deferência.

J.R.Martins - Brasília/DF

Nenhum comentário:

Postar um comentário