segunda-feira, 3 de outubro de 2011

São Luís não está preparada para receber pessoas com deficiência


Escadaria impede acesso ao palco na praça Maria Aragão
Calçadas cheias de buracos, lixo nas ruas, falta de sinalização especial. São muitos os problemas que as pessoas com deficiência enfrentam para andar em São Luís. A capital maranhense, quase quatrocentona, não está preparada para atender adequadamente a todas as pessoas. Hoje, muito pouco é oferecido a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida - que inclui também gestantes e idosos a partir de 60 anos. Essa é a constatação do Fórum Maranhense de Entidades com Pessoas com Deficiência e Patologia.

Em entrevista ao Blog, o coordenador do Fórum, Dilson Bessa, disse que apesar da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) já ter disponibilizado a NBR 9050, norma técnica que estabelece critérios para a acessibilidade de pessoas com deficiência em edificações, espaço mobiliário e equipamentos urbanos, ainda não há investimentos suficientes que permitam o acesso de todas as pessoas na maior parte dos lugares visitados, principalmente, nos equipamentos turísticos. O Centro Histórico da cidade, por exemplo, é uma área onde a circulação de cadeirantes é muito difícil e isso se dá devido ao calçamento de pedras portuguesas que dificultam a locomoção. Algumas rampas são íngremes e acabam dificultando o acesso às calçadas.

Para Bessa, os dispositivos legais ainda não são empregados de maneira eficiente, pois não existem investimentos no setor e, principalmente, fiscalização. “Até mesmo com a intervenção do Ministério Público não tem sido atingido. A prefeitura de São Luís recorreu em várias ações do Ministério em termos de parada de ônibus, acessibilidade nas praças Maria Aragão e Gonçalves Dias, ela recorreu e perdeu; recorreu pra não tornar a prefeitura acessível e perdeu. Então, a barreira de atitude ainda é muito grande, muito forte, o trabalho do Ministério Público é bom, mas ainda há muito descumprimento da legislação”.

E completa: “Hoje as escolas públicas que tem uma pessoa com deficiência é o dinheiro de duas pessoas; para elas é vantajoso ter um aluno com deficiência, mas o nível de exclusão é tão grande
que tem um programa nas escolas voltado para portadores de deficiências e 70% dos jovens em idade escolar que recebem um salário mínimo através desse programa estão fora da escola e isso estamos falando de 150 municípios do Maranhão que aderiram ao programa. Em São Luís tem 2.450 crianças que recebem o beneficio, sendo que 500 estão fora da escola, então o nível de exclusão é enorme, e isso por falta de adaptação, de transporte, dos bairros que não são acessíveis - sem paradas de ônibus, calçadas, rampas, sinalização e isso dificulta muito sair de casa”.

Setor turístico está desatento às condições de acessibilidade

Segundo Bessa, há carência de informações, de funcionários capacitados, tecnologias, hotéis e restaurantes acessíveis e transporte adequado para o atendimento do turista com deficiência. “As dificuldades de acesso são muito grandes. Dificilmente se tem um carro adaptado e não há rampas na maioria dos terminais, pontos turísticos e aeroportos”, destaca.

Ele ressalta que São Luís vai completar 400 anos no próximo ano e que a cidade precisa se preparar para receber turistas portadores de deficiência, que representam um segmento como qualquer outro, com grande poder de consumo. “A cidade para todos está só no nome, não é para todos. São Luís é uma cidade muito excludente, muito difícil de se locomover, não só para os cadeirantes mas para a pessoa que é cega também, deveria ter sinalização sonora nas saídas dos terminais de integração, de escolas, de lojas, de igrejas, que são locais de muita circulação de trânsito mas não tem, então isso é uma dificuldade”, diz.

“Hoje a gente não fala mais de rampa, banheiros acessíveis para cadeirantes porque isso já está na pauta; convencionou-se a ter só isso, mas não é só banheiro e rampa que precisamos, é banheiro, rampa, estacionamento, transporte, um profissional de libras – a pessoa com deficiência chega numa repartição pública ou numa recepção de hotel e não tem alguém que saiba libras que é oficialmente por lei uma segunda língua do país, então precisa de toda essa preparação”, completa.

Dilson Bessa lembra que as pessoas com deficiência gozam dos mesmos direitos dos demais consumidores e devem ser tratadas com respeito e dignidade, de modo a exercer a cidadania. Para ele, as mudanças no cenário atual podem acontecer se houver uma ação conjunta de todos os envolvidos no setor turístico (entidades, hotelaria, companhias aéreas, etc.), além do apoio do governo.

Falta de acessibilidade

“As pessoas deficientes, qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade, o que implica, antes de tudo, o direito de desfrutar de uma vida decente, tão normal e plena quanto possível” afirma a Organização das Nações Unidas (ONU) em relação aprovada ainda na década de 1975.

No Brasil, somente em 12 de novembro de 1985, foi sancionada pelo presidente da República a lei que tornava obrigatória a colocação do ‘’Símbolo Internacional de Acesso” em todos os locais e serviços que pudessem ser utilizados por pessoas portadoras de deficiência. Este foi um dos primeiros passos em direção a plena inclusão de deficientes na sociedade brasileira. De lá para cá, foram desenvolvidos e implantados diversos outros mecanismos para assegurar direitos e garantir o acesso total aos deficientes. Entretanto, ainda existe um longo caminho a percorrer, principalmente, nas cidades históricas.

Quase quatrocentona, São Luís, dá o exemplo perfeito de como uma pessoa com necessidades especiais não deve ser tratada. Na hora de atravessar a faixa de pedestre, no Centro da Cidade, nenhum dispositivo sonoro para quem não enxerga. Nas paradas de ônibus, nem som, nem sinalização em braile indicando as linhas e os itinerários dos ônibus. Calçadas sinalizadas no piso com uma espécie de bolinhas em relevo são uma raridade. Mais fácil encontrar buracos e desníveis.

E as dificuldades na acessibilidade em São Luís não param por aí. É preciso esperar por quase meia hora por um coletivo adaptado para deficientes físicos. Mesmo com a chegada do ônibus, os transtornos continuam. A primeira dificuldade é para o motorista conseguir operar o elevador para que o cadeirante suba ao veículo. Muitos não conseguem baixar o elevador completamente – o equipamento enguiça e isso é comum acontecer. Para recolher o equipamento, mais meia hora.

Inclusive, o problema da capital maranhense tomou dimensão nacional após veiculação de uma reportagem do programa Fantástico da Rede Globo. Segundo a reportagem, São Luís tem o pior atendimento para cadeirantes, no que diz respeito ao transporte público. Além de São Luís, o teste foi realizado ainda no Rio de Janeiro, Porto Alegre, Goiânia e São Paulo.

Barreiras de Atitude

Para o coordenador do Fórum Maranhense de Entidades de Pessoas com Deficiências e Patologias, Dilson Bessa, falta atitude por parte do poder público em atender as entidades e movimento que lutam pela implementação de políticas públicas para as pessoas com deficiência.

Ele destaca que a discriminação maior são as barreiras de atitude. “Há condição sim de tornar acessível, hoje tem possibilidade de acessibilidade em qualquer lugar, tem plataforma elevatória, tem os engates de cadeira de roda, então equipamentos e condições de garantir acesso tem, não é desculpa, não é dificuldade, hoje a barreira mesmo é a de atitude, do gestor, do prefeito, do governador, do secretário que devem assumir uma responsabilidade com a pessoa com deficiência que é um segmento grande e que precisa sair da exclusão e entrar na sociedade”.

Segundo Bessa, “o próprio Iphan é contraditório, pois dificulta criar acessibilidade em vários locais, como no Centro Histórico, mas o prédio dela é toda acessível - tem plataforma elevatória, piso direcional, sinalização em braile, etc. É barreira de atitude mesmo, a gente precisa de calçada livre, dá pra ter sinalização pra cego nas calçadas e não está descaracterizando nada. Existe uma má vontade, uma falta de compreensão da legislação, porque tornar acessível não é descaracterizar, às vezes há a possibilidade de descaracterizar mas é mínima e necessária, porque vai garantir que uma grande quantidade de pessoas tenha acesso a cultura, mas em geral não precisa descaracterizar”.

E finaliza: “É necessária parceria entre a iniciativa privada e o Poder Público para que as coisas melhorem. O esforço tem de ser conjunto”.

Outro lado

Procurada pela reportagem do blog, a superintendente regional do Iphan/MA, Kátia Bogéa, esclareceu que o órgão não recebeu nenhum projeto de mobilidade urbana, de acessibilidade do Fórum Maranhense de Pessoas com Deficiências para que o Iphan/MA possa analisar e aprovar. "Quem tem que propor esse tipo de projeto é a prefeitura, não tem outra instituição que tenha essa determinação. O cidadão ele pode fazer na casa dele, mas em termos de cidade, quem propõe mobilidade urbana, acessbilidade é a prefeitura, a municipalidade, é ela que detém a gestão do solo urbano, do planejamento urbana".

A superintendente disse ainda que "o Iphan/MA repassou os recursos para a prefeitura, através de convênio do PAC das Cidades Históricas, para que ela contrate com esses recursos o plano de mobilidade e acessibilidade de São Luís do Centro, porque o Iphan só é responsável pela área tombada federal, agora o restante da cidade de São Luís é um caos completo, os bairros todos não tem acessibilidade, não chega nem a ter calçada".

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