quarta-feira, 7 de março de 2012

Os bondes, o Centro Histórico e o 4º Centenário


Ivan Sarney

No meu primeiro mandato, tive a oportunidade de propor, através de Requerimento aprovado na Câmara, que a então Prefeita Conceição Andrade determinasse a realização de estudos técnicos, visando avaliar a possibilidade de reimplantação das linhas de bondes que a cidade possuiu, até o final dos anos sessenta, como forma alternativa de transporte coletivo, na área do Centro Histórico.

Fiz essa proposição por considerar que o crescente fluxo de ônibus de transporte coletivo, no centro da cidade, trazia e traz uma série de inconveniências de caráter social e ambiental, além de representar uma grave ameaça à preservação do conjunto arquitetônico tombado, pelos danos à fundaçãodaquelas edificações. 

Que inconveniências de caráter social e ambiental são essas? A poluição atmosférica, pelo gás carbônico; a poluição sonora, pelos elevados ruídos dos motores; os cada vez mais frequentes engarrafamentos; os ricos de vida a transeuntes nas calçadas; a deformação da camada asfáltica, pelo peso desses veículos; o abuso de velocidade, incompatível com o centro; os aumentos no custo das passagens. Além disso, a ameaça à preservação dos imóveis tombados, por danos causados à suas fundações, pelo peso das tonelagens desses veículos, quando lotados. 

Os estudos requeridos, por mim, não foram procedidos pela administração municipal, o que nos fez perder algum precioso tempo no cronograma de uma possível adoção desse transporte alternativo, em nossa cidade. Por que os bondes? Algumas pessoas chegaram a criticar essa idéia, quando ela foi posta em discussão. Mas uma grande maioria fez abordagens positivas da proposta, por considerar sua oportunidade e sua pertinência, em se tratando de São Luís.

Da minha parte, defendi e defendo essa proposição baseado em argumentos históricos e contemporâneos que são difíceis de refutar. Senão vejamos: os bondes já existiram como transporte coletivo, em nossa cidade, envolvendo toda a sua área urbana, até o final dos anos sessenta, quando a febre de desenvolvimento os extinguiu. Eles tinham uma escala compatível com a cidade e faziam o trajeto de suas principais ruas, movidos à eletricidade. Esse é o argumento histórico. O fato de terem sido movidos a eletricidade nos fornece o argumento fundamental de sua contemporaneidade: não eram e não seriam poluentes agora, nem do ponto de vista sonoro, nem do ponto de vista do ar atmosférico, uma vez que não produziam e não viriam a produzir resíduos químicos nenhum. 

Além disso, tinham um custo barato para a população e eram muito bucólicos, contribuindo para um clima romântico, para um convívio social mais intenso entre as pessoas que os utilizavam, e personalizavam a nossa cidade, com muita propriedade.

É claro que os bondes de agora não seriam os mesmos de outrora. Seriam bondes modernos, talvez mais compridos, com uma tecnologia mais moderna, com um conforto mais aprimorado, compatível com nossas necessidades de cidadãos modernos. Porém, com as características fundamentais de serem movidos a eletricidade, que temos em abundância e que não é poluente, contribuindo para a preservação da natureza e para uma melhor qualidade de vida, a partir do ar atmosférico. 

Os novos bondinhos poderiam ficar restritos ao Centro Histórico, circulando em suas áreas tombadas, levando e trazendo pessoas, em suas diversas linhas que poderiam ser as mesas dos bondes de outrora, cujos trilhos estão sob a camada asfáltica que cobre as ruas onde outrora eles circularam. 

A proposta de reativação dessas linhas de bonde se contrapõe, para mim, à realidade que hoje está imperando na cidade, com danos a médio e longo prazo para a preservação de nosso grandioso acervo tombado, que já possui uma grande parcela inscrita pela UNESCO, como Patrimônio Cultural da Humanidade. 

A realidade que está imperando é a realidade do ônibus e do micro ônibus, das Vans, de todo um conjunto de inconveniências do ponto de vista ambiental e urbano, por serem poluentes químicos e visuais, por contribuírem para um tráfego mais lento, mais conturbado e caro, uma vez que utilizam recursos naturais esgotáveis como o petróleo: no combustível, pneus e aditivos. Esses veículos, a partir da implantação dos bondes, deixariam de circular pelo centro da cidade, restringindo-se também a circulação de automóveis, por medidas paralelas e complementares.

Não tenho a menor dúvida que a reativação desses bondes, como transporte coletivo no Centro Histórico, será um ponto de grande influência no processo de revitalização do núcleo tombado, fazendo com que pessoas possam transitar com mais tranqüilidade, com mais economia, com mais satisfação por essa parte da cidade que já está merecendo uma atenção especial do governo do Estado, com a continuidade das obras do Projeto Praia Grande (Reviver), visando prepará-la também para receber maior fluxo turístico, nos próximos anos. Uma cidade mais humanizada, do ponto de vista urbano, é o que queremos.

A proposta de retorno dos bondes não está sendo feita com argumentos saudosistas, mas com fatos históricos, com evidências contemporâneas fortes, o que nos leva a alimentar esperanças quanto às suas possibilidades de execução material.

Os trilhos dos bondes estão aflorando em muitos pontos da cidade, teimando em não sucumbirem, definitivamente. Quem sabe, por esses trilhos ainda correrão novas rodas, novos sonhos, novas esperanças que os motorneiros, cobradores dos velhos bondes tanto souberam conduzir e alimentar. Amar a cidade é projetá-la no novo milênio. É preciso amar a cidade...

Publicado no Jornal O Estado do MA

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