sábado, 14 de abril de 2012

CACHORRADA

Por J.R.Martins 
Há dias a mídia vem-se ocupando com um assunto gerador de polêmica e que tem revoltado a grande massa de criadores de cachorros. Cachorros, não: cães. A palavra cachorro, de algum tempo para cá, tomou uma conotação depreciativa. Digamos, até mesmo, discriminatória. Cachorro, agora, são apenas aqueles animais sem dono que perambulam vagabundamente pelas ruas das cidades. Não têm compromisso com aparência, são inconvenientes, remexem latas de lixo e, se encontram portas abertas, invadem casas em busca de comida ou algum carinho. Nunca tomam banho, exceto se encontram alguma fonte disponível ou se vivem à beira-mar. Neste caso, é comum vê-los atirando-se às ondas, como se fossem em busca de alguma onda adequada para pegar “jacaré”.

Mas, o assunto que quero abordar diz respeito mesmo aos “cães”. Aqueles bem tratados, que se alimentam de ração balanceada e cara, freqüentam salões de beleza, enfeitam-se com produtos de grife vendidos em lojas especializadas, conhecidas como pet shops, e, quando doentes ou desmotivados da vida, freqüentam as clínicas e hospitais para curarem-se dos males do corpo e do espírito. Afinal, essas frágeis criaturas, como os humanos, sofrem de estress e depressão.

Um vizinho preocupado com o bem estar de um desses pobres indefesos invadiu a privacidade de uma mulher que morava ao lado e filmou tudo. Foi flagrada maltratando seu pobre poodle, jogando-o contra a parede e, por fim, sufocando-o em um balde que lhe cobriu o corpo. Foi a óbito, para usar um eufemismo muito em voga. Uma crueldade nunca vista. Claro!... com animais de estimação!
Logo, o vídeo percorreu o mundo, através da internet.

A pobre mulher teve de prestar depoimento na delegacia de polícia (que falta não faz uma delegacia especializada em cães, hein?). Foi entrevistada pela imprensa escrita, falada e televisada. Chorou, desculpou-se, jurou nunca mais repetir a monstruosidade. Ao que me parece, dentro de mais alguns dias posará nua para uma revista masculina. Com o dinheiro que ganhar comprará uma matilha de animais de raça e dedicará parte da vida dedicando-se a eles. Será uma forma de redimir-se do mal que praticou.

Agora... fico pensando. E os cachorros? Aqueles vadios que vivem perambulando pelas ruas, brigando entre si e apanhando pauladas de todo mundo? Quando morrem atropelados são enterrados condignamente em cemitérios especiais, como os cães das madames? Acho que não! Geralmente apodrecem no asfalto até serem consumidos pelos urubus, que assim efetuam a limpeza pública. Não merecem sequer uma pequena nota fúnebre dos jornais e da televisão.

Outra coisa: esses que só faltaram trucidar a “assassina” do cãozinho, por acaso, preocupam-se com a devastação das florestas, com a morte e extermínio de tantas espécies ainda desconhecidas; de milhões de animais indefesos e que desaparecerão da face da terra? Certamente não!

Tenho pensado seriamente em uma coisa: diariamente morrem cremados vivos ou de inanição e frio, nas ruas das cidades, pobres alienados pela sociedade que não têm um lugar digno onde terminar seus dias. Criaturas que não merecem de muitos um mísero trocado para comprar um pão. Queimam-lhes impiedosamente as vestes, dão-lhes pauladas até morrerem. A repercussão na imprensa é, quando é, a mínima possível. O assunto não desperta o interesse daqueles que preferem não desviar o foco de suas fúteis ambições. Melhor fazer vista grossa para essa espécie de acontecimento.

Bem feito! Quem mandou não terem nascido pequineses, dálmatas, cockers, poodles, yorkshire terriers, pit bulls ou outros de estirpe nobre? Adoradas criaturas que representam uma população quase igual à dos chamados “seres inteligentes” e geram milhares de empregos na fabricação de produtos alimentícios, cosméticos, medicamentos, indumentárias, além de estimularem a formação de novos médicos veterinários?!

Já foi tempo em que se dizia com toda a propriedade quando alguém passava necessidades: fulano leva uma vida de cachorro!

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